sexta-feira, 9 de julho de 2010

11 cachorros

Dizem que era 11 o número de rottweilers que havia no sítio do goleiro Bruno do Flamengo.
Deixando um pouco de lado as luzes ofuscantes da mídia, tem uma coisa que não sai da minha cabeça: O que será que vão fazer com os quadrúpedes (no sentido não pejorativo) que, sem querer, se envolveram num dos crimes mais chocantes envolvendo um jogador de futebol?

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Chega a equipe de pastores alemães da polícia e o capitão deles, o Dentinho, ladra: Aê cambada de vira-latas, Estão todos presos! Vão todos virar sabão!

Bola 8, o rottweiller mais velho e, portando, o porta-voz da matilha, toma a frente e defende sua matilha...

Eu ladro em nome de todos aqui. Me chamo Bola 8. E nós não matamos ninguém.
Mas o dono de vocês sim. E vocês omitiram a prova do crime. E isso dá cadeia também.
Que prova?
O corpo da Eliza! Vocês comeram ela...
Os únicos que comiam ela por estas bandas eram o Bruno, o Macarrão, o moleque de 17 anos, o padeiro, o porteiro, o vigia, o seu Roberto da locadora, o frentista do posto BR, o rapaz que cuida da piscina, uns outros que não me lembro agora e o Elias, um vascaíno que entrega água...
Não estou ladrando de sexo, seu idiota!
Está ladrando de quê então dentinho?
Vocês comeram a Dona Eliza! Comeram a carne dela! Assim, esconderam as evidências do crime. Estão todos presos!
Você tá louco? Aqui a gente come ração. E quando rola churrasquinho ganhamos uns pedaços de carne.
Sei. E quando foi a última vez que vocês ganharam carne?
Faz pouco tempo. O seu Bruno trouxe um saco preto cheio de carne e deu pra gente rangar. Eu fiquei com os melhores pedaços, claro. Mas tinha uma coisa estranha...
Desembucha logo Bola 8!
A carne tinha mesmo um gosto diferente. Era uma mistura de vaca, galinha e peixe... tipo aqueles pequenininhos de rio.
Sardinha?
Não, piranha mesmo.
Bola 8, você consegue visualizar a situação? Vocês se banquetearam com a carne da pobre moça;
Que horror! - nessa hora bola preta começa a vomitar uma gosma (destas que cachorros vomitam no tapete da nossa sala). Os outros 10 cachorros que acompanhavam tudo de perto e ouviram a história fizeram a mesma coisa simultaneamente. Subiu um cheiro de leite azedo e o canil todo do sítio virou uma grande poça de gosma fedorenta. Logo depois Bola preta e os outros pedem licença e vão até o canteiro para mastigar uns matinhos. Em 2 minutos, algumas tossidas e novas golfadas, todos voltam à mesma posição e bola 8 continua o diálogo com Dentinho, capitão dos pastores alemãs da polícia de Belo Horizonte.
Mas Dentinho, a gente só comeu porque achamos que era sobra de churrasco, não somos criminosos, você sabe!
Sei?
Lógico. Como é que poderíamos saber?
Sabe como é a justiça, não é Bola preta? Os homens tão em cima aí... a cachorrada na rua tá fazendo cocô na Gávea, na porta do clube, em protesto ao caso. O Maracanã já é bosta pura. A gente precisa prender vocês ou a merda vai continuar.
Mas somos inocentes. Seremos presos por almoçar? - ao falar isso bola preta lembra de novo que se alimentou de carne humana, abaixa o focinho e começa e sair gosma de novo. Como que sombras suas, 10 rottweilers fazem a mesma coisa. A cena se repete: cheiro de azedo, matinho, mais golfo e volta o diálogo.
Você vê? Só de falar nisso nos dá ânsia! E veja Capitão Dentinho, há cadelas e filhotes entre nós. Formamos todos uma família, não apenas uma matilha. Nós amamos uns aos outros e cuidamos um do outro. Protegemos um ao outro. Está vendo aquele pequeno ali, o Biro-Biro? - bola 8 aponta para uma graça de filhote. Preto, bem preto. Com olhinhos redondos e brilhantes. Patas largas, dentinhos afiados e dono de uma carinha tão fofa que era impossível para um ser humano, vê-lo e não abaixar para fazer um carinho em suas bochechas falando com voz diferente (já reparou como mudamos a voz pra falar com filhotes?). Capitão Dentinho se emociona. Lembra de seu próprio filhote. E vai além, lembra de quando ele mesmo era um filhote muito amado, antes de se alistar à polícia canina mineira. Nesse momento uma lágrima escorre no fucinho de Dentinho (se fosse um cachorro qualquer seu dono juraria que era uma remela nojenta. E limparia com um pedaço de papel).
Bola 8, vamos fingir que vocês não estavam. Pegue sua família e dê o fora daqui.
Obrigado Dentinho, obrigado!
Vá logo antes que eu me arrependa.

A partir daí não tem mais diálogo. Bola 8 e todos os outros cães, cadelas e filhotes saem pela porta dos fundos do sítio, a mesma que o vascaíno da água usava para suas visitas noturnas ao quarto de Eliza. Dizem por aí que desde ontem uma matilha de 11 rottweilers vaga pelas ruas da grande capital mineira. São todos cães dóceis e não caçam nem pombos, gatos e ratos. É uma matilha muito feliz, dirão as pessoas.

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Isso tudo só pra dizer que de animal, animal mesmo, só o Bruno!